agosto 28, 2010

a Televisão como instituição de autoridade

Finalmente consegui ver um dos mais importantes estudos realizados sobre a Televisão e os seus efeitos psico-sociais. Le Jeu de la Mort (2010) é um estudo realizado sob a forma de concurso de televisão encenado para realizar de novo o experimento de Milgram. O trabalho foi agora conduzido pelo sociólogo Jean-Léon Beauvois. O que se pretendia era estudar os efeitos da autoridade, mas aqui já não os da Ciência, mas da Televisão.

Neste estudo à semelhança da experiência de Milgram coloca-se um primeiro sujeito numa posição de "questionador/torturador" e um segundo como "respondente/vítima". O segundo é um actor, mas o primeiro não sabe, e é no fundo o verdadeiro jogador e sujeito observado. Assim o jogador tem de aplicar choques eléctricos em crescendo sempre que o outro não acerte na questão. Os choques começam abaixo dos 100 volts fazendo pouco mais do que cócegas e vão até cerca dos 500 volts onde infligem dor grave. Assim e de forma totalmente surpreendente enquanto no experimento de Milgram apenas 62% foram até ao último choque final, aqui foram 80%. Só este dado faz deste um documentário/estudo que todos deviam ver e tomar consciência. Mais dados podem ser obtidos no blog do autor do estudo.


Para mim o mais relevante desta experiência é a retirada do apresentador de cena e a constatação de que nesse caso 75% das pessoas desistem do jogo. O que explica o dado concreto da Obediência. Estamos moldados para obedecer à Televisão, para obedecer às autoridades celebradas pela televisão, como se estas soubessem distinguir o bem do mal, e nos pudessem mostrar o caminho. Em tudo semelhante à religião. Aliás no texto anterior sobre a Geração de 70 é isso que se releva, o facto de toda esta geração ter substituído o valor tão Português de Fátima da geração anterior pelo valor da Televisão.
"A instituição da televisão é de tal modo poderosa que ultrapassa já a da religião." Jean-Léon Beauvois
Mas como nos diz Shermer talvez tudo isto não seja gerado pela Religião mas antes pela necessidade que o Homem tem de acreditar. E aqui vamos ainda mais longe e mostramos nesta experiência que não é uma necessidade de Acreditar na Televisão, assim como não o foi em épocas ou regimes totalitárias mas é antes uma necessidade absolutamente humana, no seu sentido de ser gregário, de OBEDECER.

Metropolis (1927) de Fritz Lang
“A chave está na Obediência. Nós somos todos seres obedientes, porque viver em grupo é obrigar-se a regras às quais nós devemos obedecer. Leis que nós aprendemos desde o nosso nascimento. A punição ensina-nos que nós não desafiamos a autoridade sem consequência. Pouco a pouco vamos aprendendo quem são as autoridades a quem devemos obediência: pais, professores, médicos, nós não obedecemos a qualquer um... Em adultos, acreditamos que somos seres autónomos, livres e independentes, de facto somos seres sozinhos ligados aos outros através de regras e leis que nos confrontam em permanência aos poderes e às autoridades às quais nós nos submetemos sem reflectir” Narrador
Brave New World (1932) de Aldous Huxley
"Uma instituição que se forjou em 50 anos de emissões de TV de propagação de um modelo de comportamento, espalhado todos os dias pelos nossos lares.. e este mutou-se com a TV Realidade... para ganhar a TV mostrou-nos que é normal Humilhar, Eliminar, ser Sádico. É isto que torna possível este experimento, porque este modelo de comportamento está muito mais integrado do que aquele que outras instituições nos impõem.” Narrador
“Passamos 9 anos a trabalhar mas 14 anos a ver a televisão. Ver a televisão tornou-se a segunda actividade a seguir a dormir. Por isso é ela que impõe os seus valores, difunde os seus modelos ao ponto de se ter tornado uma autoridade plenamente legitima para nos levar a fazer o que ela quer. É isto que explica que 30% dos jogadores não tenham em momento algum tentado contestar as ordens.” Narrador
"Na televisão ninguém está normalmente stressada, as pessoas devem enviar uma imagem positiva e dinâmicas... isto reenvia-me para quando estou do outro lado quando estou a ver a televisão e estou bem... não ousei levantar-me porque tinha medo do público me urrar...." Jogador

"O que retenho desta experiência é que nós tivemos pessoas que eram parecidas com as outras, que não eram pessoas de excepção e 80% numa situação o mais natural do jogo, comportaram-se como possíveis torturadores." Jean-Léon Beauvois
"Este dado, 80%, reflecte o Poder que a Televisão conquistou, que é no entanto relativamente aterrador. Antes houve a massa dos fiéis, a massa dos trabalhadores, a massa dos soldados, aqui existe essa massa de indivíduos televisualizados, porque eles foram fabricados pela mesma formação, pela mesma publicidade, pelas mesmas séries e foram mesmo fabricados pelos mesmo jogos, pelos mesmo talk-shows... e esta massa é uma massa criada ao nível dos pensamentos, ao nível das atitudes, ao nível dos comportamentos, e por isso chamo a isto um Totalitarismo. Ele é tranquilo porque não nos prendem, e não nos metem na prisão.” Jean-Léon Beauvois
"Estou contente de ter participado nesta experiência, porque isto deverá ajudar-nos a ter consciência que temos de estar em alerta em relação a vocês (TV), a tudo isto... a deriva é demais." Jogador

Sem comentários:

Enviar um comentário